Vieses cognitivos e decisão médica a interferência da heurística de semelhança no raciocínio clínico

Abstract

Introdução: A Heurística de Semelhança (HS) julga a probabilidade diagnóstica de uma condição clínica pelo grau em que o quadro do paciente é similar ao estereótipo de uma patologia. Logo, pode levar a erros médicos previsíveis. Objetivo: Avaliar a influência da HS sobre o raciocínio e a tomada de decisão médica. Métodos: Médicos de um hospital público foram randomizados em 2 grupos para responder um questionário online com 2 situações-problema (SP) sobre HS: a primeira com um cenário de Síndrome de Takotsubo (STK) e a segunda de Tromboembolismo Pulmonar (TEP). Concluída a leitura das SP, questionou-se a probabilidade percentual de a determinada patologia ocorrer. No entanto, as SP diferiram-se entre os modelos de questionário, visto que apenas uma delas continha o estímulo à HS implícito no enunciado. O primeiro modelo apresentou a questão sobre STK sem o estímulo à heurística e a sobre TEP com, enquanto o segundo apresentou o exato oposto. Sobre os cenários sem estímulo heurístico, não houve semelhança com o quadro das patologias questionadas. Em contraste, os cenários com o estímulo heurístico incorporaram a HS com a adição de uma informação específica nas SP: abalo emocional na questão de STK e histórico recente de cirurgia ortopédica na de TEP. Tais adicionais tornaram o quadro clínico semelhante ao estereótipo das patologias, apesar de agregarem pouco às probabilidades pré-teste de STK e TEP dos casos clínicos – ambas mais baixas quando comparadas a de outras etiologias, como síndromes coronarianas agudas. Assim, nas questões com o estímulo à HS, sua ocorrência foi considerada se o participante atribuiu alta probabilidade à patologia questionada. Ao final, as probabilidades diagnósticas das questões com e sem estímulo à heurística foram comparadas através do teste T de Student não-pareado. Para a análise primária, P significativo <0.025. Resultados: O total de médicos respondentes foi 61. Destes, 33 (54%) responderam o segundo modelo de questionário, 42 (69%) eram do sexo feminino e 19 (31%) eram especialistas. Maiores probabilidades diagnósticas foram atribuídas às SP com estímulo à HS sobre STK e TEP (p = 0.02 e p = 0.002, respectivamente). Conclusão: A heurística de semelhança exerce influência sobre o raciocínio e a tomada de decisão médica, podendo levar a erros diagnósticos.